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sábado, 29 de janeiro de 2011

SOCORRO

Eu tenho uma amiga que vem de uma família de Marias. Por tradição, todas as mulheres tem nomes compostos, sendo o primeiro sempre Maria. E por décadas e décadas foram surgindo todas as combinações, que sempre acompanhavam os modismos. Tudo começou com a Maria de Lourdes, Maria da Conceição,  Maria Eugênia até a nova safra com as sobrinhas Maria Clara e Maria Luisa. Mas o destino sabe o que faz. Para ela, justo para ela, foi o escolhido, há uns 30 anos atrás, a combinação Maria do Socorro.  Um baita karma. Mas não sabiam os pais como estavam sendo precisos na escolha.
Na escola até que ela aguentou, quase sempre com bom humor, as inevitáveis brincadeiras e trocadilhos com seu nome. E como carioca abrevia tudo, rapidamente ficou conhecida apenas como Socorro. Para os íntimos S.O.S. Mas foi na vida adulta que a maldição do nome se concretizou.
Ela tinha tudo para dar certo, exceto o nome, é claro. Imagina o que deve ser passar uma vida inteira ouvindo os outros gritarem por Socorro. E esse socorro no caso, não é uma emergência ou situação ruim e sim a sua pessoa. Ela é bonita,  inteligente, simpática, sabe se cuidar e leva a vida quase sempre numa boa. Ela se dá bem em todos os setores de sua vida: trabalho, família e amigos. Mas na vida sentimental ela vive pedindo um help.
Assim como a Bela Adormecida, que após furar o dedo numa roca foi salva da maldição pelo beijo do príncipe encantado, Socorro acredita piamente que um dia um amor verdadeiro irá quebrar o feitiço do seu nome. E após anos tentando ser salva, ela será feliz para sempre. Quantas noites ela perdeu pensando em como tudo teria sido mais fácil se o seu nome fosse Linda, Vitória ou Valentina. Nomes muito mais positivos, para cima, alto astral.
Mas enquanto isso não acontece, Socorro vai treinando o seu esporte favorito: revezamento de sapos.

O primeiro ela batizou de Sapo Peter Pan. Ele adorava estar com ela, mas não se sentia preparado para assumir um compromisso sério, apesar dela ser sua companhia certa para casamentos, enterros e batizados. Mas o menino era muito novinho, tinha apenas 36 anos e meio e uma relação de dependência com a mãe. Um era prioridade zero do outro. Era tanta prioridade que parecia que ambos ainda estavam ligados por um cordão umbilical virtual... E quem pagava esse preço eram as mulheres que por ele passavam. Como iriam preencher o lugar da mulher da vida dele, se este lugar não estava vazio? Às custas de muitas lágrimas Socorro entendeu isso tudo e o deixou livre para procurar outra Wendy. Fim.
Depois veio o Sapo Micareta. Era super romântico e fiel, desde que no mesmo dia não rolasse um show da Ivete, um carnaval fora de época em alguma cidade brasileira (não importava a distância) ou um carnavio. No quesito vestimenta, ostentava com orgulho como camisetas seus ex-abadás, seja qual fosse o programa. Um graça. Super fashion e adequado a um jantar romântico, por exemplo.  Geralmente em março ele já estava com o carnaval do ano seguinte na Bahia  pré-pago. E depois de todos esses eventos é claro que ele não faltava as ressacas dos mesmos. Óbvio que ia a tudo sozinho (ele e sua gangue de amiguinhos entre 30 e 40 anos), pois como dizia uma de suas comunidades nas redes sociais: “só caso quando o Bel morrer”. Nota da autora: Bel, para quem tem o prazer de não saber, não é só o apelido de Isabel. É também o vocalista do Chiclete com Banana, o sensacional grupo de música baiana que arrebata milhares de seguidores com letras profundas, refrões fantásticos e coreografias infanto-xuxa-fetais. Da mesma forma que quando ouvimos essas músicas, por mais que não gostemos, custam a sair da cabeça, Socorro demorou para esquecer o Sapo Micareta. Mas um belo dia ela decorou a música certa e se pegou cantando: “então diga que valeu, nosso amor valeu demais”. Assim, um amor conjugado no passado. Fim.
Até que um dia surge o Sapo Ciumento. Esse é um clássico constante em qualquer currículo feminino que se preze e no dela não podia faltar. Era um americano lindo que fez Socorro acreditar que a solução seria partir para o produto importado. O rapaz fazia de questão de estar com ela, ligava sempre, mas tinha ciúmes até da própria sombra. E cada vez que Socorro tentava se explicar, a coisa piorava. Todas as brigas eram sem fundamento. Ele abriu uma CPI sobre o passado dela e parecia anotar as respostas, para futura conferência de dados. Uma vez ele a acusou de estar olhando para um cara de blusa verde na mesa de trás, cara esse que ela nem imaginava se era negro, branco ou fantasma.  Mas em matéria de ciúmes ele era bissexual pois se incomodava tanto com mulheres como com homens que conversassem em particular com  Socorro. Depois de concluir que para ter tanto ciúmes ou ele já tinha sido muito traído ou ele traia muito, Socorro tentou cortar o mau pela raiz terminando tudo. E graças ao orgulho dele não houve insistência. Ciumentos geralmente são bastante orgulhosos, como defesa a sua insegurança. Dessa vez Socorro foi até legal.  Terminou, mas orientou o rapaz que fosse procurar uma namorada num berçário, pois para dar certo ele, só mulher sem passado.
Nisso entra um novo aluno no curso de inglês, nem bonito, nem feio. Socorro até preferia os feios, achava que dava menos trabalho, mas o cara era  very smart e bem simpático. Logo no início foi surgindo uma amizade, um ajudava o outro no homework, até que um dia a turma saiu após o curso para beber e quando Socorro já estava bem mais altinha que seu 1,75 cm, tudo rolou. Aí viveram mais de um mês numa doce lua de mel, tudo dando certo, só alegria, achando graça até de topada em móvel. Só que chega aquela hora clássica que ele resolve se abrir e falar das ex’s.  E pelo relato do rapaz, Socorro o batizou instantaneamente de Sapo Masoquista. Como o bichinho gostava de sofrer. Colecionava ex’s que o dominavam com técnicas manjadas e baratas de terror psicológico. E por medo ele ficava com elas. Não que gostasse. Talvez esse comportamento viesse da relação autoritária que a mãe tinha com ele, mas isso não vem ao caso. Não ao caso de Socorro. É gente, podem acreditar. Tem homens que vem ao mundo para apanhar e para serem mandados. Se você trata bem, cuida, ajuda, eles até admiram, mas na cabeça deles o seu lugar é numa estante bem alta, como um troféu que não conseguem atingir, nem suportar o peso. O peso de uma mulher leve, normal, num mundo tão doido, com os valores todos invertidos.  Não sabendo como lidar com toda essa leveza, ele descartou Socorro. Era muito para ele. E foi a caça de outra que falasse mais alto, que desse ordens, golpes de todo tipo (incluindo o velho golpe da barriga), que se fizesse de vítima, de pobre coitada, que vivesse pedindo ajuda para tudo, para levar carro na oficina, levá-la para o salão, que infernizasse ligando para ele mil vezes ao dia durante o seu trabalho e, last but not least, que carregasse a bolsa dela nos ombros. Cá entre nós, existe coisa mais patética que homem passeando no shopping carregando a bolsa de cobra verde da mulher nos ombros? Acho que isso devia ser proibido. A não ser que a mulher estivesse de cadeira de rodas ou muletas. Mas como tem mulher para tudo, o Masoquista logo acha uma nova Dominadora que o bote ele no seu devido lugar. Um lugar inferior ao dela, é claro. FIM.
Se vocês estão lendo esperando um final feliz, sinto muito em frustrá-los. Corram para a banca de jornal mais próxima e procurem um romance barato de bolso, estilo Sabrina.
É gente, é triste mas tenho que contar o próximo capítulo. Socorro não está mais por aí, vagando de sapo em sapo. Ela se casou com o Sapo Marido. No início foi aquela euforia, tudo fica lindo quando visto pelas lentes da paixão.  Os primeiros meses de adaptação morando juntos até que não foram tão difíceis. Mas paixão tem tempo de vida, prazo de validade. E quando as máscaras caiem e a rotina entra pela porta da frente sem pedir licença, Socorro começou a duvidar de suas escolhas.  Ela acordava super cedo, dirigia mais de 1 hora até o trabalho, trabalhava num pique estressante até tarde. E quando chegava em casa para o segundo turno, tinha louça para lavar, casa suja, comida para fazer e um marido esparramado no sofá da sala pedindo uma coca light com gelo e algumas gotinhas de limão espremido. E mais tarde, quando ela entrava no seu terceiro turno do dia tinha que tomar banho e ficar linda, cheirosa e fogosa para a noite. Mas atravessar do quarto ao banheiro era uma verdadeira corrida de obstáculos, com toalha molhada em cima da cama, cuecas não lavadas pelo banheiro, jornal espalhado pelo chão, quilos e mais quilos de roupas usadas jogadas no carpete e  uma pilha de contas para pagar na mesinha de cabeceira. Desse jeito nem a Mulher Maravilha daria conta. E ainda tinha umas tias velhas que em toda reunião de família clamavam por filhos. Quarto turno? Num dia de só 24 horas? Porque quando os filhos nascem os homens até ajudam, mas não dura mais que o resguardo da mulher. Acho que ajudam só para ficar registrado nas fotos, trocando fraldas, dando banho. E Socorro já tinha visto muito bem esse filme com as suas amigas.  No fundo ela gostaria de saber quem foi que escreveu esse script para nós mulheres? Talvez nosso erro tenha sido tomar pílula e queimar os sutiãs. Mas não podemos culpar ninguém, fomos nós que quisemos mudar, né, ganhar o mundo, direitos iguais... Mas queríamos iguais, não muito mais obrigações para a gente.
Mas para quem está curioso, Socorro continua com a Sapo Casado, acreditando que as coisas vão entrar nos eixos um dia, que ele vai colaborar, que vão dividir prazeres, lazeres e afazeres. Pensa até em terapia de casais, mas acha que ele não vai topar, vai achar frescura. Mas deixa ela, né. É melhor ter esperanças do que sofrer com a realidade nua e crua. Eu também prefiro assim, pois pelo menos não se gasta com anti-depressivos.
Socorro me pediu que contasse a estória dela para vocês pois queria fossem divulgados todos os golpes da praça e todos os tipos de vírus, desculpe, digitei errado, quis dizer de Sapos. É claro que faltou muito coisa na listagem. Não falamos do Sapo Mau-humorado (aquele que humilha garçons), do Mentiroso (que inclusive acredita nas próprias mentiras), do Que-se-acha (que constrói todo o seu discurso para se auto elogiar nas entrelinhas), do Briguento (que além de fazer feio e brigar ainda tem orgulho de contar para os outros), do Hipocondríaco (que te troca por qualquer crise que o acometa) e por aí vai.
Aguardo comentários de vocês. Pois assim, da próxima vez que a gente entrar numa de brincar de conto de fadas vamos ter uma ideia melhor se o Sapo em questão não passa de um girino ou tem potencial a ser explorado.
E cá entre nós, a gente reclama deles, mas não consegue viver sem. Pois aí, quem vai para o brejo somos nós...
OBS: Vocês sabem que depois de escrever tanto estou meio em dúvida se minha amiga se chama mesmo Socorro. Quem sabe não é Paula, Cristina, Adriana, Juliana ... Mas que o nome Socorro representa muito bem todas nós quando o assunto é relacionamento homem/mulher, isso representa.

Janeiro /2011


quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

VEM CÁ LUISA

Há uns seis anos atrás, eu estava dirigindo na Ayrton Senna, quando minha irmã me ligou avisando que estava grávida. O quadro era o de sempre: ela apavorada, eu assustada, eles apenas namoravam, qual seria a reação dos nossos pais, já batia o medo da responsabilidade etc.  Desligamos. Alguns segundos depois eu retorno para ela correndo pois esqueci de avisá-la que o filho(a) dela já tinha madrinha. Choramos as duas, é claro. Ela me deu a notícia quando ainda estavam de férias em Angra e me pediu segredo. Quando chegaram aqui no Rio, as duas figuras, que o destino transformava instantaneamente em pais, chegaram a sugerir dar a notícia em forma de pegadinha, pedindo que nossos pais adivinhassem a charada: o que é, o que é, que foram para Angra em dois e voltaram em 3? Ainda teve mais um detalhe cômico, eles deixaram as malas no carro com medo de serem expulsos e pelo menos terem o que vestir na sarjeta. Pobres almas que por um momento esqueceram que já estávamos no século XXI.  Na hora H eu que tive que dar a notícia pois os dois se entreolhavam mudos. Mas o destino não quis e o bebê não foi adiante. Difícil e traumatizante para todo nós, mas vida que segue.

E eu não sabia que não perdia por esperar ...
Mais ou menos um ano depois, vem a notícia da gravidez, agora para valer. Aí foi tudo muito mais tranquilo. Com relação a “madrinhês” deixei minha irmã bem a vontade. Ela podia escolher quem ela quisesse, mas se não fosse eu, eu não falaria mais com ela. Acho que joguei limpo e fui super sincera.
Durante a gravidez fui escrava dela, seguindo o meu lema: “grávidas podem tudo”. Até jejum fiz com ela um dia para um exame de sangue (evento esse que nós duas temos pavor, mas esse assunto dá um outro texto inteiro).
 Até que em julho de 2006 nasce a Luisa. Um pouco prematura, mas super saudável e sabem com quem que ela parecia? Com um ratinho, de pouco mais de 2 Kg e meio. Foi amor a primeira vista, mas junto com o amor vem um kit completo (que a gente não vê nos comerciais de produtos para bebês): novos cuidados, exames, vacinas, cueiros, noites sem dormir, amamentação difícil, cansaço, fraldas, mais noites sem dormir, bico de silicone (Jesus, o que é isso), enfim, uma enxurrada de novidades e dúvidas.
Ela foi crescendo e aos poucos fomos percebendo que era muito bem humorada, gostava de brincar e na hora da bagunça se entregava tanto que acabava com soluços.
Com um 1 ano começou a andar e enfiou o dedo no bolo descobrindo o que era chocolate.
Com 1 ano e 8 meses falava tudo. Aliás, se ela tem um dom, este é o do fala. De frases feitas a palavras difíceis. Tudo escapava da sua boca com naturalidade e na mais tenra idade. Com 1 ano e 11 meses falava inclusive palavrões. Mas ela não tinha culpa. Criança pequena é como papagaio, repete o que ouve. E ela ouvia... Pensando em mudar o foco de sua atenção, a avó resolveu lhe ensinar “o maior palavrão do mundo”: INCONSTITUCIONALÍSSIMAMENTE. E rapidamente ela já estava repetindo. Rendeu até vídeo no youtube e foi a sensação entre o seu fã-clube.
Mais ou menos nessa época sua bisa teve um AVC e depois de duas sessões de fono em casa pegamos Lulu falando sozinha, como se cantarolasse: “ma, me, mi, mo, mu; la, le, li, lo, lu” e por aí ia ela combinando vogais e consoantes ao seu bel prazer.
 Com 2 anos foi ao pediatra, para a visita de rotina, e o mesmo a consultou, sem precisar perguntar nada a mãe. Conversaram abertamente sobre alimentação, brincadeiras, vacinas, machucados etc. Ele garante que foi uma das consultas inesquecíveis de sua vida.
Também com 2 anos entrou na escola. Nossa adaptação foi mega difícil. Digo nossa porque a família também sentiu muito. Ela chorava e às vezes até vomitava pois não queria ficar na escola de jeito nenhum, apesar de se divertir depois que o choro parava e de termos escolhido uma escola maravilhosa, com profissionais idem. Um certo dia ela pediu a mãe um sutiã, com o argumento de que se ganhasse, pararia de chorar. E parou. Problema resolvido.
Um dia no elevador a vizinha elogiou o seu vestido e disse que quando encontrasse um bem bonito, compraria para ela. Ela aceitou imediatamente e completou: “mas por favor compra um sapato também, eu calço 23”. Número esse exato dos seus pés, que nem a mãe, já roxa de vergonha, sabia de cor.
Com 2 anos e pouco desenvolveu uma atração incrível por anões. Um dia no shopping chamou uma anã para brincar, variando inclusive o tom de voz.  “Tatibitati” para a anã e voz normal quando elogiava a mesma para sua mãe. Tempos depois, no supermercado depara-se com uma família inteira de anões e um deles chupava chiclete. Na mesma hora ela começa a gritar: “ele é menor que eu e tá chupando chiclete, por que eu não posso?”.
Com quase 3 anos, o Michael Jackson morreu. Vendo a revista Veja pediu a avó que contasse a estória do cantor para ela, como se fosse mais um conto da Carochinha. A avó adaptou-a como pode a sua faixa etária. Dias depois, ela estava no shopping em frente a uma TV que noticiava o falecimento do mesmo. Nisso ela virou-se para um homem que também assistia a matéria e soltou a pérola: “era um negro tão bonito, mas tomou tanto remédio para ficar branco que morreu. Agora já era”. O homem não acreditou no que tinha acabado de ouvir. Depois disso, disse que queria o cantor como tema da sua próxima festa de aniversário, mas pena que ele não poderia comparecer como personagem vivo.


Com 3 anos e 4 meses ela inventou uma palavra e nós a corrigimos. Imediatamente ela retrucou dizendo que se o Monteiro Lobato podia inventar palavras, ela também podia. Ela referia-se a palavra “despilofar”, que quer dizer desmaiar, pirar, que a Emília fala logo após tomar a pílula falante, quando ainda estava aprendendo a falar. Palavra essa que, graças a Lulu, foi incorporada ao vocabulário de muita gente grande do nosso meio. Então fique esperto, se você ouvir por aí alguma conjugação desse verbo, tipo “despilofei”,  já fique sabendo o significado e que a origem não veio do latim.
Um dia, assistindo ao Jornal Nacional, ela vê o presidente Obama falando da nova vacina da gripe suína e solta: “ferrou, vai chegar aqui a vacinação”.
Desconfiamos que tem vocação para as artes cênicas. Diferenciamos claramente o seu choro verdadeiro do artístico, assim como sua entonação de voz quando quer agradar. Ela também  encarna personagens por temporada. E muitas vezes não aceita ser chamada pelo nome próprio. A primeira personagem foi a Emília do Sítio do Pica Pau. Queria por que queria uma fantasia da boneca, mas nós não achávamos. Até que um dia ela se irritou e disse que nós não estávamos procurando direito, que era só digitarmos na internet fan-ta-si-a-da-e-mí-li-a e pagar com o cartão de crédito. Depois veio a Stephanie (de Lazzytown), a Iara (a Mãe d’água, também do Sítio), a Dorothy (do Mágico de Oz) e a Violeta (dos Incríveis). Isso sem falar na paixão pelo ET , por toda a via láctea, planetas e naves espaciais e em seu desejo de ir para Marte, que é onde ela acha que o ET mora. Noutro dia mesmo deixou uma carta na caixa do correio da casa da avó para o ET, achando que o mesmo pararia sua a nave e a pegaria.

Hoje Lulu tem 4 anos e nosso relacionamento é um misto de amizade, admiração, muito amor, muito diálogo (e como ela dialoga, sua curiosidade é infindável ...), muito trabalho e  muito grude. Costumo brincar que meu corpo se divide em cabeça, tronco, membros e afilhada.
Uma das últimas dela foi agora nas eleições presidenciais quando me perguntou se eu iria votar no Serra ou na Dilma. Digo que no Serra e ela conclui: “ah, só por que ele disse que vai aumentar o salário mínimo, né?”.
Dizem por aí que não existe amor maior do que o de mãe. Mas não aceito que digam que o amor de madrinha é uma versão genérica desse amor. Não porque tem médicos que dizem que genérico não é a mesma coisa.  Mas não estou falando de madrinha que só vê no aniversário ou que acha que a obrigação é só dar presentes nas datas certas. Estou falando de quem bota a mão no hipoglós, se suja de canetinha, de gouache e depois de crescidinha divide maquiagens, shampoos,  hidratantes e perfumes. Garanto que é um amor gigante e muitas vezes cantado em verso e prosa. A gente é que não sabe que o autor fez a canção para o afilhado, como aquela que diz “avião sem asa, fogueira sem brasa, sou eu, assim sem você , futebol sem bola, Piu Piu sem Frajola, sou eu assim sem você ...”
Mais do que amor nós temos uma parceria de vida, uma cumplicidade construída num dia a dia onde, contando assim parece tudo engraçado, mas nem tudo são flores. Educar é foda, com o perdão da palavra (que ela não me ouça e nem me repita).
Dizem que faço muito por ela. Mas não chega nem aos pés do que ela faz por mim. A presença dela ameniza qualquer problema, cura qualquer tristeza, me dá ânimo para continuar, para me esforçar, para ser uma pessoa melhor, para dar o exemplo. Enfim, ela é uma injeção de alegria sem o desconforto da agulha. E posso tomar todo dia que não faz mal. Mas que vicia, vicia.

Acho que é isso. Falei. Estou mais leve.
PS: Madrinha coruja eu? De forma alguma, mera impressão sua.


Janeiro / 2011

ANO NOVO


Ano novo, vida nova. Mas o que muda quando trocamos de calendário?  Acho que nada, né. Principalmente para quem não muda um pouco a cada dia. Particularmente não acredito que mudanças quânticas e radicais deem certo. Para mim tem que ser devagar e sempre. E essa tem sido a missão: pensar, planejar, tentar mudar, e quando dá errado, começar tudo de novo. Sempre ouvi que com a idade a gente tem muito menos paciência com o que nos desagrada, o que nos irrita e o que nos faz mal. O que me irrita? Injustiça de qualquer tipo, gente que vive de auto-elogios,  que não ri de si mesmo e que escolhe levar a vida mal humorada, pensando sempre no pior. A vida é um jogo e a única opção que temos é fazer o melhor jogo possível com as cartas que temos em mãos.  Não adianta lamentar pelo valete que não veio, nem invejar a dama que caiu em mãos adversárias.     
Comecei minhas mudanças pelo cabelo, sei  que é clichê e não há nada original nisso, mas tenho que ser sincera com vocês. Quem de nós mulheres nunca correu para o salão quando brigou com o namorado ou quis marcar o início de uma nova fase? E fui logo cortando uma franja mesmo tendo um rodamoinho (quem é mulher entende o grave risco que corri), mas acabou dando certo e depois diminui bastante o comprimento. Abaixo a ditadura dos cabelos super longos! Garanto que fiquei com a cabeça mais leve. Por dentro e por fora. Só ainda não virei loura. Coisa que até pouco tempo eu poderia jurar que nunca aconteceria. Mas depois de criar coragem e dar uma leve clareada, não digo que dessa água oxigenada não beberei.
Acertei minhas contas com o dentista e coloquei o aparelho que eu devia desde os 12 anos. E olha que amiga dentista, e da boa, nunca faltou do meu lado. Está sendo uma experiência inesquecível, uma delícia, se é que vocês me entendem. Você sorri e os lábios não fecham naturalmente. Aí você cria um cacoete. Um charme só. Agora já está no final e vou tirar em breve. A frase acima se baseia nos meus vastos conhecimentos neurolinguísticos e é para você, querida amiga e dentista, sei que não preciso revelar seu nome pois você já captou o meu recado. Mas recomendo, o resultado vale muito à pena.
Mudei também meus ídolos. Eu que nos primórdios fui fã da Blitz, com todo orgulho de ter prestigiado o produto nacional, ao invés de uns Menudos que não queriam ver ninguém reprimido... Eu que depois migrei para o Senna e cujo final da estória infelizmente todos nós sabemos... Eu que fui fã do Guga ... Eu atualmente sou mega fã, com muito orgulho e sem vergonha de dizer, da Super Nanny. Compro tudo dela: livro, DVD, álbum de figurinha e assisto aos programas sempre que posso. Eu que adoro crianças, admiro o controle que ela consegue ter e tento aplicar os conhecimentos na prática, mas às vezes acho que faço tudo errado... Mimo, cedo a chantagens e faço o que eles querem. Mas eles ficam tão felizes... Ah, sou fã também da Martha Medeiros, cada vez mais, livro após livro. Quando eu crescer quero escrever igual a ela. Ah, isso eu quero.
Sobrevivi a uma traição nos últimos tempos. Troquei o chá verde tangerina pelo chá preto pêssego. Quem não dá assistência e some das prateleiras, abre para a concorrência. Não é assim o ditado? Depois não adianta voltar cheio de amores e com nova embalagem. Mas ok, isso acontece nas melhores famílias.
Ganhei mais um afilhado. Agora no assunto “madrinhês” acho que tenho pós-doutorado. Já tenho um de prima, uma de irmã e agora um de amiga. E falo, de cadeira, que não tem coisa melhor. Dizem que a função da madrinha é cuidar do afilhado, apoiá-lo durante a vida. Mas esquecem de falar da função do afilhado.  Para mim, eles são fonte de alegria, anti-depressivos em forma de gente, sem tarja preta, sem receita presa e sem efeitos colaterais. E ainda nos fazem sentir super especiais quando, por exemplo, só querem pentear o cabelo com a gente, tomar a vacina (mesmo a de gotinha) com a gente ou quando organizam uma festa surpresa no nosso aniversário cujo tema, só para implicar, é o animal que a gente tem mais pavor. Então nesse ponto estamos conversados. Afilhados: eu recomendo e dou garantia.
Ah, estou voltando a estudar. Depois de uma longa temporada longe dos livros. Dos livros de estudo, que fique bem claro, porque dos outros se eu me afastar não sobrevivo. Por enquanto só estudei, fiz prova e passei para o mestrado. Quem me conhece bem consegue me imaginar estudando raciocínio lógico depois de velha? Para vocês terem uma ideia é o mesmo que ensinar russo a uma tribo indígena do interior do interior do Amazonas. Pois é, essa foi mais uma surpresa que a vida aprontou comigo. Estou super animada. Garanto que rejuvenesce muito mais do que cremes e botox.  Mas vocês já repararam que não existe uma capa de caderno feita para adulto? Estou em dúvida entre uma toda rosa com glitter da Hello Kitty ou outra com uma pose super sexy do Justin Bieber.
Ando numa fase meio brega. Curtindo umas músicas de uma cantora super popular, cujo nome não vem ao caso.  O agravante é que na minha canção preferida ela ainda canta em inglês. “Super chique”. E a letra fala de vazio interior, superação, olhar para frente com bons olhos no amanhã. Naaaaaaaaaada piegas. Livro de auto-ajuda perde. Mas não ligo, não nego, me faz bem e canto feliz da vida.
Quanto ao meu Flamengo, talvez seja melhor mudar de assunto. Perdemos apenas um goleiro, um ídolo, um carioca, um brasileiro, uma Libertadores e por aí vai. E ainda tivemos que ver o Galinho saindo de cena. Mas o erro foi dele, não devia nem ter entrado. Minha avó sempre fala aquele ditado dos que com porcos se misturam e acabam tendo farelo como refeição. Mas pelo menos não fomos rebaixados. Há sempre uma maneira de ver as coisas positivamente. Mas vem aí um novo ano e o manto sagrado pesa, a nossa torcida pesa e como diz nosso hino, Flamengo até morrer eu sou.  Mas se não der em nada de novo, que pelo menos o Cielo nade e nos dê alegrias.
Acho que então estamos conversados. E entre mortos e feridos, todos sobrevivemos ao ano que passou. Choramos, sorrimos, mas no fundo foi um ano joia (agora sem acento). E eu, como sou uma otimista incorrigível, tenho fé que 2011 vai ser muito mais legal. E só a gente acreditar e fazer a nossa parte. A minha eu garanto.


Janeiro / 2010